Decisão do STF: Réus têm o direito de escolher perguntas no interrogatório

Segunda Turma entendeu que a negativa para que acusado responda exclusivamente a perguntas da defesa provoca nulidade de interrogatório.

Réus podem escolher perguntas no interrogatório – direito ao silêncio

A Segunda Turma do Supremo Tribunal Federal (STF) emitiu uma decisão significativa no processo RHC 213849, reafirmando

o direito dos réus de escolherem as perguntas que desejam responder durante o interrogatório.

A controvérsia surgiu quando dois réus solicitaram responder apenas às perguntas formuladas por seus advogados, pedido que foi negado pelo juiz.

A Turma entendeu que tal negativa violou o direito constitucional ao silêncio, um importante instrumento de defesa.

Este é um precedente importantíssimo para a sua prática penal.

Hoje, vamos falar dessa recente decisão do STF e relembrar alguns aspectos sobre o direito ao silêncio.

Leia mais abaixo:

Contextualização do Caso

No caso em questão, um casal foi denunciado por tráfico de drogas, acusado de armazenar maconha em sua residência.

A denúncia afirmava que o imóvel era utilizado para armazenamento e venda de drogas aos usuários da região.

Durante a audiência de instrução, os réus solicitaram o direito de responder apenas às perguntas formuladas por sua defesa.

No entanto, o juiz encerrou a audiência, alegando que o direito ao silêncio não poderia ser exercido de forma parcial.

Recurso ao STF

Após a rejeição do pedido para anular o interrogatório pelo Tribunal de Justiça do Estado de Santa Catarina (TJ-SC) e pelo Superior Tribunal de Justiça (STJ), a defesa recorreu ao Supremo Tribunal Federal.

O Recurso Ordinário em Habeas Corpus (RHC) 213849 foi ajuizado com a alegação de constrangimento ilegal e violação do direito ao silêncio.

Fundamentação da Decisão

O relator do caso, ministro Ricardo Lewandowski, negou o pedido inicialmente, mantendo sua posição mesmo diante do recurso (agravo regimental).

No entanto, outros ministros divergiram e destacaram a importância do direito à não autoincriminação,

ressaltando que o exercício desse direito não implica em assumir culpa.

O ministro Edson Fachin enfatizou que o direito constitucional à não autoincriminação deve ser exercido de forma a harmonizar a defesa do acusado com a preservação de sua condição de inocência.

Ele observou que o Código de Processo Penal não impõe restrições à promoção da ampla defesa durante o interrogatório,

o que inclui a escolha das perguntas a serem respondidas.

Por sua vez, o ministro Gilmar Mendes ressaltou que o interrogatório é um direito do acusado, não um dever,

e que a decisão de responder ou não às perguntas deve ser deixada a seu critério.

Ele afirmou que o réu tem o direito de responder a todas, algumas ou nenhuma pergunta, incluindo o direito de escolher quem fará as perguntas.

Implicações Jurídicas

A decisão da Segunda Turma do STF estabelece um importante precedente no que diz respeito ao direito dos réus no processo penal.

Reconhece-se que o direito ao silêncio não pode ser interpretado de forma restritiva,

e que os réus têm o direito de exercê-lo de maneira que melhor proteja seus interesses legais.

A decisão do STF reforça a importância dos direitos individuais no processo penal e destaca a necessidade de garantir uma defesa eficaz aos réus.

Além disso, ressalta a autonomia do acusado em decidir como exercer seus direitos constitucionais durante o interrogatório.

Advogados devem estar cientes dessa decisão ao representar seus clientes, assegurando que seus direitos sejam plenamente respeitados durante o processo judicial.

O Direito ao Silêncio e suas Bases Legais

O direito ao silêncio está consagrado em diversas legislações e tratados internacionais, bem como na própria Constituição Federal brasileira.

O artigo 5º, inciso LXIII, da Constituição Federal dispõe que

“o preso será informado de seus direitos, entre os quais o de permanecer calado”.

Essa garantia tem como objetivo proteger o acusado contra a autoincriminação forçada,

evitando a violação de sua dignidade e sua liberdade de defesa.

No âmbito internacional, a Convenção Americana sobre Direitos Humanos (Pacto de San José da Costa Rica) também assegura o direito ao silêncio.

Em seu artigo 8º, inciso 2, letra g, estabelece que

“toda pessoa acusada de um delito tem direito a não ser obrigada a depor contra si mesma, nem a confessar-se culpada”.

No Código de Processo Penal, na parte que trata do interrogatório do acusado, o direito ao silêncio está previsto no artigo 186 que estabelece o seguinte: 

Artigo 186 do CPP: Depois de devidamente qualificado e cientificado do inteiro teor da acusação, o acusado será informado pelo juiz, antes de iniciar o interrogatório, do seu direito de permanecer calado e de não responder perguntas que lhe forem formuladas.                  

Parágrafo único. O silêncio, que não importará em confissão, não poderá ser interpretado em prejuízo da defesa. 

Princípio da não autoincriminação

Assim, direito ao silêncio é entendido como o princípio da não autoincriminação.

Em outras palavras, a autoridade interrogante deve advertir o conduzido do direito a calar-se
e respeitar seu exercício.

A constitucionalidade da condução coercitiva para interrogatório

Vale lembrar que em 2019, o STF publicou o acórdão da decisão proferida nas ADPF 395 e 444, nas quais se questionava a constitucionalidade da condução coercitiva para interrogatório.

Em síntese, a ADPF 395 impugnava a condução coercitiva para interrogatório na investigação e também na instrução criminal,

razão por que seu pedido consistia na declaração da inconstitucionalidade da medida determinada como cautelar autônoma para a inquirição de suspeitos, indiciados ou acusados.

A ADPF 444, por sua vez, questionava a constitucionalidade apenas da condução coercitiva para interrogatório em fase de investigação policial.

Havia também pedido subsidiário para que se declarasse inconstitucional a interpretação extensiva para a aplicação da condução coercitiva em situações que extrapolassem os estritos termos do art. 260 do CPP.

Parte da decisão abrange o direito ao silêncio:

Potencial violação ao direito à não autoincriminação, na modalidade direito ao silêncio. Direito consistente na prerrogativa do implicado a recursar-se a depor em investigações ou ações penais contra si movimentadas, sem que o silêncio seja interpretado como admissão de responsabilidade. Art. 5º, LXIII, combinado com os arts. 1º, III; 5º, LIV, LV e LVII. O direito ao silêncio e o direito a ser advertido quanto ao seu exercício são previstos na legislação e aplicáveis à ação penal e ao interrogatório policial, tanto ao indivíduo preso quanto ao solto – art. 6º, V, e art. 186 do CPP. O conduzido é assistido pelo direito ao silêncio e pelo direito à respectiva advertência. Também é assistido pelo direito a fazer-se aconselhar por seu advogado. Potencial violação à presunção de não culpabilidade. (…)

Vide [STF. ADPF 444, rel. min. Gilmar Mendes, j. 14-6-2018, P, DJE de 22-5-2019.]

Leia também: “Limites constitucionais do direito ao silêncio: interpretação do Supremo Tribunal Federal com aproximações à doutrina do direito como integridade de Ronald Dworkin” aborda o direito ao silêncio reconhecido como direito fundamental que alcança qualquer pessoa na qualidade de investigado, indiciado, réu ou testemunha à não produção de prova contra si mesmo.

A Orientação dos Advogados Criminalistas sobre o direito ao silêncio

O papel do advogado criminalista é essencial na garantia do direito ao silêncio de seus clientes.

A orientação adequada sobre como exercer esse direito é fundamental para a proteção dos interesses e da defesa dos acusados.

Em primeiro lugar, o advogado deve informar o cliente sobre o seu direito ao silêncio,

explicando-lhe de forma clara e compreensível o significado e a importância desse direito.

É fundamental que o acusado esteja ciente de que não está obrigado a fornecer informações que possam incriminá-lo.

A postura no interrogatório

O advogado também deve orientar seu cliente sobre a postura a ser adotada durante interrogatórios policiais ou em audiências.

Recomenda-se que o acusado exerça seu direito ao silêncio de maneira firme e respeitosa,

deixando claro que está exercendo um direito fundamental e que não deseja responder a perguntas que possam prejudicá-lo.

Além disso, o advogado deve estar presente durante os interrogatórios ou depoimentos, a fim de garantir que o direito ao silêncio seja respeitado

e de que seu cliente não seja coagido ou constrangido a falar contra si mesmo.

Legislação Complementar

Além das disposições constitucionais e internacionais já citadas, existem legislações complementares que reforçam o direito ao silêncio.

Lei nº 13.245/2016, que alterou o Estatuto da OAB (Lei nº 8.906/1994), garante o direito do advogado de assistir seu cliente investigado durante interrogatório.

Essa lei resguarda o exercício da ampla defesa e fortalece a proteção ao direito ao silêncio.

Conclusão

O direito ao silêncio é um direito fundamental dos acusados e uma garantia indispensável para o devido processo legal.

A orientação adequada por parte dos advogados criminalistas sobre o exercício desse direito é essencial para a proteção dos interesses de seus clientes.

Ao informar sobre o direito ao silêncio, explicar sua importância, orientar sobre a postura a ser adotada e estar presente durante interrogatórios, os advogados estão contribuindo para uma defesa efetiva e justa.

As legislações brasileiras, como a Constituição Federal, a Convenção Americana sobre Direitos Humanos e leis complementares, reforçam a proteção ao direito ao silêncio.

Portanto, os advogados criminalistas desempenham um papel fundamental na orientação de seus clientes sobre o direito ao silêncio, assegurando que esse direito seja respeitado e promovendo uma defesa justa e equilibrada no sistema penal.

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