O acordo de não persecução penal e a Advocacia Criminal Negocial

É notável que o direito penal brasileiro evoluiu consideravelmente nos últimos anos, principalmente com a introdução de novas formas de investigação, bem como com a possibilidade de negociação direta entre o Ministério Público e o acusado/investigado.

Por isso, os advogados criminalistas precisam estar por dentro das “novas” atualizações a esse respeito e se preocupar em desenvolver habilidades de técnicas de negociação, com a finalidade de estar preparado para obter um bom acordo – se essa for a melhor estratégia da defesa – para seu cliente.

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Hoje, pensei em trazer um conteúdo introdutório ao tema, sem a pretensão de esgotar o assunto que é complexo, de certa forma, polêmico, e que sofre constantes críticas.

Na verdade, a intenção principal aqui é demonstrar a evolução da justiça negocial e alertar aos advogados criminalistas, principalmente aos iniciantes, sobre a necessidade de atualização e desenvolvimento de técnicas negociais, para a melhor atuação profissional.

Conceito da justiça criminal negocial

Em suma, justiça criminal negocial ou direito penal negocial consiste na possibilidade de haver uma negociação direta do Ministério Público com o acusado/investigado, devidamente acompanhado de um advogado criminalista.

Após a formalização do acordo, este passará para a fase de homologação judicial, ocasião em que o juiz deverá analisar as condições, bem como a sua efetivação.

Importante lembrar que, a justiça criminal negocial, até um certo momento, era limitada, se restringindo aos institutos estabelecidos pela Lei nº 9.099/95 (Lei dos Juizados Especiais), quais sejam, a transação penal e a suspensão condicional do processo.

Fato é que, com o início da “Operação Lava Jato” e todos os seus desdobramentos, os acordos de colaboração ou delação premiada, previstos na legislação desde 1990, com a promulgação da Lei nº 8.072/90, que dispõe sobre os crimes hediondos, passaram a ser frequentemente utilizados após ganhar uma forma mais prática com a Lei nº 12.850/13, que dispõe sobre as organizações criminosas e a investigação criminal.

Desta forma, foi demonstrada uma forte tendência à negociação do Ministério Público diretamente com o réu e seu advogado.

Além disso, mais recentemente, entra em vigor a Lei nº 13.964/2019, mais conhecida como “Pacote Anticrime”, que estabelece, no artigo 28 A do Código de Processo Penal, a possibilidade da realização de acordo de não persecução penal, que, como já expomos acima e a própria denominação já indica, é uma forma de acordo realizado entre o Ministério Público e o investigado e seu Advogado.

Deixando as críticas sobre este tema de lado, como sabemos, um dos princípios basilares do Código de Ética da Advocacia é a conciliação entre as partes, inclusive através da mediação, sendo este um dever de todo advogado, nos termos do parágrafo único do artigo 2º: “VI – estimular a conciliação entre os litigantes, prevenindo, sempre que possível, a instauração de litígios.”

Nesse sentido, é claro que caberá ao advogado criminalista analisar detalhadamente o caso concreto e apresentar a seus clientes todas as estratégias possíveis de defesa, inclusive a possibilidade da realização do acordo, haja vista ser um instrumento legítimo de defesa, e, algumas vezes, pode se mostrar ser o único instrumento para a situação fática.

Por isso a importância do advogado criminalista se preocupar com a sua qualificação nesse sentido, para que desenvolva as habilidades necessárias para a atuação nesse campo da justiça criminal negocial, que inclusive, pode ser um nicho com ótimas oportunidades profissionais.

Sobre o acordo de não persecução penal e seus principais aspectos

Inicialmente, o acordo de não persecução penal (ANPP), conforme estabelecido pela Lei nº 13.964/19 – Pacote Anticrime -, recentemente incluído no art. 28-A do Código de Processo Penal, já era motivo de discussões na doutrina, visto que se trata de verdadeira ampliação das possibilidades de o investigado realizar acordo com o Ministério Público antes do oferecimento da denúncia.

Fato é que, o novo instituto amplia as possibilidades anteriormente existentes de realização de acordo com as autoridades públicas, em especial o Ministério Público, antes da acusação formal.

De forma geral, o acordo de não persecução penal consiste em um negócio jurídico pré-processual entre o Ministério Público e o investigado com seu advogado, nos casos em que há confissão formal e circunstancial de infração penal sem violência ou grave ameaça, e com pena mínima inferior a 4 anos, mediante o cumprimento de determinadas condições, decretando-se, após o cumprimento integral do acordo, a extinção de punibilidade.

Com isso, evita-se o desencadear da ação penal e também a reincidência, conforme o enunciado 25 do Conselho Nacional dos Procuradores-Gerais (CNPG).

Importante destacar que, a lei fala em “infração penal”, ou seja, abrangendo contravenção e crime. Além disso, na hipótese de conexão ou continência com infração de menor potencial ofensivo, insta lembrar a jurisprudência do STJ, que afasta os benefícios da Lei nº 9.099/95, caso a soma das penas máximas ultrapasse 2 anos (art. 61), porém, não afasta o acordo de não persecução penal, que contempla a pena mínima inferior a 4 anos.

Outro ponto importante é sobre o requisito da confissão formal e circunstanciada. A confissão formal consiste na sua realização perante autoridade pública, seja policial, Ministério Público, reduzida a termo e subscrita. E a confissão circunstanciada, quer dizer nos termos do art. 41 do CPP, ou seja, detalhando todas as circunstâncias atinentes ao fato confessado, a fim de que dúvidas não subsistam para o julgador.

Destaca-se ainda que, as condições negociadas no acordo de não persecução penal precisam se demonstrar suficientes e necessárias para reprovação e prevenção do crime, objeto do negócio jurídico. Claro que se trata de expressão subjetiva que necessita de análise caso a caso, e não somente da gravidade abstrata em si do delito.

Ademais, o art. 28-A, caput, incisos I ao V do CPP, lista as cinco condições que devem ser negociadas e cumpridas pelo investigado, cumulativa ou alternativamente, são elas:

I – reparar o dano ou restituir a coisa à vítima, exceto na impossibilidade de fazê-lo;    

II – renunciar voluntariamente a bens e direitos indicados pelo Ministério Público como instrumentos, produto ou proveito do crime;   

III – prestar serviço à comunidade ou a entidades públicas por período correspondente à pena mínima cominada ao delito diminuída de um a dois terços, em local a ser indicado pelo juízo da execução, na forma do art. 46 do Decreto-Lei nº 2.848, de 7 de dezembro de 1940 (Código Penal);    

IV – pagar prestação pecuniária, a ser estipulada nos termos do art. 45 do Decreto-Lei nº 2.848, de 7 de dezembro de 1940 (Código Penal), a entidade pública ou de interesse social, a ser indicada pelo juízo da execução, que tenha, preferencialmente, como função proteger bens jurídicos iguais ou semelhantes aos aparentemente lesados pelo delito; ou

V – cumprir, por prazo determinado, outra condição indicada pelo Ministério Público, desde que proporcional e compatível com a infração penal imputada.     

Por fim, o Pacote Anticrime traz ainda as hipóteses de inaplicabilidade do acordo de não persecução penal em seu art. 28-A, §2º do CPP, quais sejam:

I – se for cabível transação penal de competência dos Juizados Especiais Criminais, nos termos da lei;     

II – se o investigado for reincidente ou se houver elementos probatórios que indiquem conduta criminal habitual, reiterada ou profissional, exceto se insignificantes as infrações penais pretéritas;

III – ter sido o agente beneficiado nos 5 (cinco) anos anteriores ao cometimento da infração, em acordo de não persecução penal, transação penal ou suspensão condicional do processo; e  

IV – nos crimes praticados no âmbito de violência doméstica ou familiar, ou praticados contra a mulher por razões da condição de sexo feminino, em favor do agressor.   

Nesse contexto, o advogado criminalista deve ter muita atenção para o fato de que a confissão não resulta de um interrogatório ou de uma instrução processual. Neste caso, o seu cliente assume o fato como meio para a obtenção do acordo de não persecução penal.

Por isso, a confissão deve ter um objetivo único, qual seja, evitar os riscos de uma persecução penal, com possível condenação, equilibrando os benefícios da realização do acordo em fase investigativa.

Para se chegar a esta estratégia defensiva, claro que é preciso que o advogado criminalista estude pormenorizadamente o caso concreto e verifique se vale a pena esse caminho da formalização do acordo, a depender do contexto fático-probatório.

Nesse ponto, se o conjunto probatório e as teses defensivas para a busca da tão almejada absolvição não forem substanciais, esses fatores podem se tornar uma grande atração para o acordo de não persecução penal.

Para essa análise da solidez ou não das teses defensivas, vale lembrar a importância da investigação defensiva.

Aliás, muitos advogados criminalistas não tem ciência da existência desse novo nicho da advocacia criminal ou, se tem ciência, não o colocam em prática.

E esse nicho da advocacia investigativa, pode ser uma grande oportunidade para alavancar a sua carreira como advogado criminalista especializado nesse ramo.

Portanto, se nessa fase inquisitorial, a prova não evidenciar a melhor tese de defesa para o seu cliente, o recomendável é o acordo de não persecução penal. Caso não seja aceito o acordo, a prova colhida na fase preliminar poderá ser usada quando do processo criminal, ou seja, será aproveitada, se for preciso.

Vale ressaltar que, se o advogado criminalista pretende realizar o acordo de não persecução penal, é aconselhável evitar contendas com o Ministério Público.

A advocacia belicosa deve ser deixada para a fase processual, ocasião em que o advogado criminalista utilizará de todas as “armas” legais para defender seu cliente.

Já na advocacia negocial, esta prescinde da belicosidade. Quem exerce a técnica de negociação, precisa seguir as estratégias, com certa paciência, e sem gerar conflitos com o Ministério Público.

Um último detalhe importante para a sua prática penal nessa situação é: tente acertar todos os pormenores e limites sobre o acordo com o seu cliente e, se possível, inicialmente, negocie com o representante do Ministério Público sem a presença do seu cliente. Isso pode ajudar a evitar indisposições.

Bom, este foi um conteúdo introdutório sobre o tema que, como já dissemos, é bastante complexo. Mas, esperamos com isso ter despertado você para novas reflexões e busca sobre o assunto que é tão importante para a sua prática criminal.

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