Do que se trata o Projeto de Lei 748/2024?
A legítima defesa é um tema sensível e recorrente no direito penal, especialmente quando envolve a proteção do lar e da vida.
O Projeto de Lei 748/2024, de autoria do senador Wilder Morais (PL-GO), vem para reformular o entendimento atual da legítima defesa, ampliando as circunstâncias em que é permitida a utilização de força letal, principalmente em casos de invasão de domicílio.
Veja o que a especialista em Direito Penal Cristiane Dupret fala sobre o projeto clicando aqui.
Este artigo visa explicar os principais pontos dessa proposta, suas implicações e as controvérsias que envolvem o tema. LEIA MAIS ABAIXO:
O que é a legítima defesa?
De acordo com o artigo 25 do Código Penal Brasileiro, a legítima defesa ocorre quando alguém, de forma moderada, repele uma agressão injusta, atual ou iminente, contra si ou terceiros.
Trata-se de uma excludente de ilicitude, ou seja, a conduta de defesa, ainda que envolva a morte do agressor, não é considerada crime se obedecer aos parâmetros legais.
Entretanto, a moderação no uso da força e o que caracteriza uma agressão “injusta” ou “iminente” são temas de constantes debates no judiciário.
Na prática, muitos casos de legítima defesa se transformam em longos processos judiciais, onde é necessário comprovar a proporcionalidade e a necessidade da reação.
O Projeto de Lei 748/2024
O PL 748/2024 propõe uma alteração no artigo 25 do Código Penal, visando estender a legítima defesa ao uso de força letal contra invasores de domicílios, imóveis ou veículos.
A principal justificativa do autor é a crescente sensação de insegurança e a necessidade de os cidadãos protegerem seus lares diante de situações de risco.
Em linhas gerais, a proposta pretende dar maior liberdade aos proprietários para defenderem seus bens e suas vidas em casos de invasão, presumindo que o invasor tem intenção hostil, o que justificaria uma resposta mais severa, incluindo o uso de força letal.
Alterações propostas
Além da ampliação da legítima defesa para situações de invasão, o PL 748/2024 inclui a legalização de dispositivos de segurança mais agressivos, como:
- Cercas elétricas;
- Arames farpados;
- Lâminas cortantes em muros;
- Lanças em portões;
- Cães de guarda treinados.
O Projeto visa incluir no artigo 25 do Código Penal, os seguintes parágrafos:
§ 2º Considera-se também em legítima defesa o agente que usa força letal para repelir invasão de seu domicílio, residência, imóvel ou veículo de sua propriedade, quando neles se encontrar.
§ 3º É lícita, para a proteção da propriedade, a utilização de ofendículos, armadilhas e artefatos semelhantes, além de cães de guarda, não respondendo o proprietário criminal ou civilmente por eventuais lesões ou mesmo pela morte do invasor.” (NR)
Essas medidas são propostas como formas legítimas de proteção ao patrimônio, sem que o proprietário seja penalizado em caso de lesões ou mortes de invasores.
Justificativa do autor
Para o senador Wilder Morais, o aumento da criminalidade e o temor de invasões justificam a criação de uma legislação mais rígida.
Ele argumenta que, ao invadir uma propriedade, o criminoso assume o risco de sofrer represálias, e o proprietário deve ter o direito de proteger sua vida e seus bens sem receio de ser processado por excesso de legítima defesa.
Inspirado pelas “Stand Your Ground Laws” dos Estados Unidos, que permitem o uso de força letal para proteção em determinadas circunstâncias, o senador acredita que a proposta fortalece a posição dos cidadãos na defesa de seus direitos.
Direitos humanos e críticas
A ampliação da legítima defesa para casos de invasão de domicílio, no entanto, não está isenta de críticas.
Diversos especialistas em direito penal e defensores de direitos humanos argumentam que a flexibilização da norma pode gerar uma escalada da violência.
O uso de força letal em situações que poderiam ser resolvidas de maneira menos letal pode resultar em abusos, além de colocar em risco a segurança de terceiros.
A introdução de dispositivos de segurança mais agressivos também levanta questões sobre o risco de acidentes, especialmente envolvendo pessoas que não tenham intenções criminosas.
Há o temor de que a legislação incentive respostas desproporcionais, aumentando os casos de violência doméstica e acidentes trágicos.
Tramitação do Projeto
O PL 748/2024 está em fase de análise na Comissão de Segurança Pública do Senado, sob relatoria do senador Jaques Wagner (PT-BA).
Após essa etapa, o projeto ainda precisa ser discutido na Comissão de Constituição, Justiça e Cidadania (CCJ) antes de ser levado ao plenário para votação.
O projeto promete provocar intensos debates tanto entre os parlamentares quanto na sociedade civil, já que o tema da legítima defesa toca em questões fundamentais sobre segurança pública e os limites da atuação do cidadão na proteção de sua propriedade.
Próximos passos
Caso o projeto avance, o Brasil poderá ver uma mudança significativa no tratamento dos crimes de invasão de domicílio.
A possibilidade de uso de força letal contra invasores terá um impacto direto no comportamento de proprietários e criminosos, além de poder influenciar a maneira como a sociedade enxerga a violência e a segurança pública.
Os debates legislativos que ocorrerão nos próximos meses serão cruciais para definir os rumos dessa proposta.
Os advogados criminalistas terão um papel importante ao questionar a proporcionalidade e a razoabilidade dessas medidas, especialmente diante da complexidade dos casos de legítima defesa que surgirão com a nova legislação.
Considerações finais
O PL 748/2024 levanta uma discussão necessária sobre os direitos dos cidadãos à legítima defesa, mas também requer cautela para evitar excessos e garantir que a legislação não se torne um estímulo à violência.
Advogados criminalistas devem se manter atentos às mudanças propostas, dado o impacto direto que elas terão sobre a defesa de acusados e as interpretações de legítima defesa nos tribunais.
A participação ativa da sociedade e dos profissionais do direito será essencial para garantir que a lei, se aprovada, seja aplicada de forma justa e equilibrada, respeitando os direitos fundamentais e garantindo a segurança coletiva.
Esse artigo permite que advogados reflitam sobre a abrangência do PL 748/2024, preparando-se para os desafios jurídicos que poderão surgir com a implementação de tais mudanças na legislação.