Como funciona o processo de violência doméstica?

Como funciona o processo de violência doméstica?

1. Introdução à Violência Doméstica

O processo de violência doméstica no contexto do Código de Processo Penal e da Lei Maria da Penha exige um conhecimento profundo das normas legais, jurisprudência e doutrina.

Neste artigo, vamos examinar detalhadamente o processo jurídico envolvido, citando artigos de lei, jurisprudência relevante e entendimentos doutrinários recentes.

Se você já é nosso aluno ou aluna do Curso de Prática na Lei Maria da Penha, não deixe de enviar suas dúvidas.

Neste curso, o conteúdo é analisado de forma detalhada, com aplicação em casos concretos, englobando a doutrina e o posicionamento dos Tribunais Superiores.

Leia mais abaixo:

2. Contexto Legal da Lei Maria da Penha

O Código de Processo Penal (CPP) estabelece as diretrizes para procedimentos criminais no Brasil.

A Lei Maria da Penha – Lei nº 11340/2006 – foi um marco na legislação, introduzindo mecanismos específicos para combater a violência doméstica e familiar contra a mulher.

Um entendimento doutrinário corrente é que a Lei Maria da Penha representa uma lex specialis em relação ao CPP,

significando que suas disposições têm primazia quando há conflito entre as duas.

O que é a Lei Maria da Penha?

A Lei Maria da Penha é uma legislação brasileira que foi promulgada em 2006 com o objetivo de coibir e prevenir a violência doméstica e familiar contra a mulher.

Ela leva o nome de Maria da Penha Maia Fernandes, uma mulher que foi vítima de violência doméstica por muitos anos

e que se tornou um símbolo de luta pela proteção das mulheres.

A Lei Maria da Penha estabelece medidas de proteção para as vítimas de violência, define o que é violência doméstica e familiar,

e prevê punições mais rigorosas para os agressores.

Ela também criou juizados especializados e promove ações de educação e conscientização sobre o tema.

Quem é considerada vítima de violência doméstica segunda a Lei Maria da Penha?

Conforme seu artigo 2º, toda mulher, independentemente de classe, raça, etnia, orientação sexual, renda, cultura, nível educacional, idade e religião, goza dos direitos fundamentais inerentes à pessoa humana,

sendo-lhe asseguradas as oportunidades e facilidades para viver sem violência, preservar sua saúde física e mental e seu aperfeiçoamento moral, intelectual e social.

Vale lembrar que o TJDFT já decidiu que um homem transgênero, vítima de violência doméstica tem o direito a medidas protetivas de urgência previstas na Lei Maria da Penha (11.340/2006). Leia mais aqui.

Além disso, em 2022, por unanimidade, a Sexta Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) estabeleceu que

a Lei Maria da Penha se aplica aos casos de violência doméstica ou familiar contra mulheres transexuais.

Considerando que, para efeito de incidência da lei, mulher trans é mulher também, no caso concreto, o colegiado deu provimento a recurso do Ministério Público de São Paulo e determinou

a aplicação das medidas protetivas requeridas por uma transexual, nos termos do artigo 22 da Lei 11.340/2006, após ela sofrer agressões do seu pai na residência da família. Leia mais aqui.

Portanto, é muito importante que você, como advogado criminalista especializado, acompanhe esses entendimentos jurisprudenciais sobre a Lei Maria da Penha.

3. Medidas Protetivas de Urgência na Lei Maria da Penha

As medidas protetivas são um aspecto crucial da Lei Maria da Penha.

De acordo com o art. 22, as medidas podem incluir o afastamento do agressor do domicílio, a proibição de contato com a vítima, a suspensão do porte de armas, entre outras.

Vejamos o artigo na íntegra:

Art. 22. Constatada a prática de violência doméstica e familiar contra a mulher, nos termos desta Lei, o juiz poderá aplicar, de imediato, ao agressor, em conjunto ou separadamente, as seguintes medidas protetivas de urgência, entre outras:

I – suspensão da posse ou restrição do porte de armas, com comunicação ao órgão competente, nos termos da Lei nº 10.826, de 22 de dezembro de 2003 ;

II – afastamento do lar, domicílio ou local de convivência com a ofendida;

III – proibição de determinadas condutas, entre as quais:

a) aproximação da ofendida, de seus familiares e das testemunhas, fixando o limite mínimo de distância entre estes e o agressor;

b) contato com a ofendida, seus familiares e testemunhas por qualquer meio de comunicação;

c) frequentação de determinados lugares a fim de preservar a integridade física e psicológica da ofendida;

IV – restrição ou suspensão de visitas aos dependentes menores, ouvida a equipe de atendimento multidisciplinar ou serviço similar;

V – prestação de alimentos provisionais ou provisórios.

VI – comparecimento do agressor a programas de recuperação e reeducação; e      (Incluído pela Lei nº 13.984, de 2020)

VII – acompanhamento psicossocial do agressor, por meio de atendimento individual e/ou em grupo de apoio. (Incluído pela Lei nº 13.984, de 2020)

Outras medidas e força policial

Segundo o parágrafo 1º do artigo 22 da Lei, as medidas referidas neste artigo não impedem a aplicação de outras previstas na legislação em vigor,

sempre que a segurança da ofendida ou as circunstâncias o exigirem, devendo a providência ser comunicada ao Ministério Público.

Além disso, conforme o parágrafo 2º do mesmo dispositivo, na hipótese de aplicação do inciso I, encontrando-se o agressor nas condições mencionadas no caput e incisos do art. 6º da Lei nº 10.826, de 22 de dezembro de 2003,

o juiz comunicará ao respectivo órgão, corporação ou instituição as medidas protetivas de urgência concedidas e determinará a restrição do porte de armas, ficando o superior imediato do agressor responsável pelo cumprimento da determinação judicial, sob pena de incorrer nos crimes de prevaricação ou de desobediência, conforme o caso.

E a lei ainda permite que o juiz requisite o auxílio da força policial para garantir a efetividade das medidas protetivas de urgência.

Quem pode conceder medida protetiva?

Na maioria das situações, as Medidas Protetivas de Urgência começam com o registro de ocorrência, seja pela Polícia Militar ou diretamente na Delegacia de Polícia Civil,

ocasião em que a vítima solicita ao oficial a concessão dessas medidas.

Depois que a ocorrência é registrada, em casos de violência doméstica ou familiar contra a mulher, a autoridade policial deve enviar, dentro de 48 horas,

um documento ao juiz com o pedido da vítima para a concessão de Medidas Protetivas de Urgência.

Quando o pedido da vítima é recebido, cabe ao juiz, também dentro de 48 horas, analisar a solicitação e tomar uma decisão sobre as Medidas Protetivas de Urgência,

além de informar ao Ministério Público para que este adote as ações necessárias (art. 18 da Lei Maria da Penha).

Importante notar que o juiz pode conceder as Medidas Protetivas de Urgência tanto a pedido do Ministério Público quanto a pedido da vítima.

Quando deve ser concedida a medida protetiva?

As medidas podem ser concedidas de imediato, sem necessidade de audiência entre as partes ou manifestação do Ministério Público, que, no entanto, deve ser informado imediatamente da concessão.

As Medidas Protetivas de Urgência podem ser aplicadas individualmente (apenas uma medida) ou combinadas (várias medidas para proteger a integridade da vítima), podendo ser substituídas a qualquer momento por outras mais eficazes,

caso os direitos das mulheres, estabelecidos na Lei 11.340/06 (Lei Maria da Penha), estejam em risco ou sejam violados.

Revisão das medidas concedidas

Além disso, o juiz pode, mediante solicitação do Ministério Público ou a pedido da vítima, conceder novas Medidas Protetivas de Urgência ou revisar as já concedidas,

se julgar necessário para proteger a vítima, seus familiares ou seu patrimônio, após ouvir o Ministério Público.

Jurisprudências recentes têm reforçado a importância de medidas protetivas para garantir a segurança da vítima, destacando decisões do Superior Tribunal de Justiça (STJ) que enfatizam a necessidade de uma resposta rápida para proteger as mulheres em situações de risco.

4. Procedimentos no Código de Processo Penal

O processo de violência doméstica começa com o registro do boletim de ocorrência, seguido do inquérito policial (art. 6º do CPP).

A investigação deve ser conduzida de forma ágil e eficiente para garantir a segurança da vítima.

Segundo o art. 41 da Lei Maria da Penha, a ação penal nesses casos é pública incondicionada, o que significa que o Ministério Público pode iniciar a ação independentemente do desejo da vítima. Vejamos:

Aos crimes praticados com violência doméstica e familiar contra a mulher, independentemente da pena prevista, não se aplica a Lei nº 9.099, de 26 de setembro de 1995.

Em março de 2011, o Plenário do Supremo Tribunal Federal (STF) decidiu que os acusados de violência doméstica contra mulher devem responder ao processo sem serem beneficiados por medidas como

a reparação do dano, a transação penal (acordo com o Ministério Público) e a suspensão condicional do processo, independentemente de a infração se tratar de crime ou de contravenção penal.

A decisão foi tomada no julgamento do Habeas Corpus (HC) 106212 e determinou o alcance do artigo 41 da Lei Maria da Penha (Lei 11.340/2006), que veda a aplicação da Lei dos Juizados Especiais (Lei 9.099/1995).

Este entendimento é amplamente aceito pela doutrina e reforçado por decisões judiciais que ressaltam a necessidade de ação imediata para proteger a integridade física e psicológica das vítimas.

5. A Aplicação da Lei Maria da Penha e competência

A Lei Maria da Penha criou juizados especializados em violência doméstica (art. 14), responsáveis por julgar casos de violência doméstica contra a mulher.

Um entendimento doutrinário predominante é que os juizados especializados facilitam a aplicação efetiva da Lei Maria da Penha,

permitindo uma abordagem mais sensível às questões de gênero e violência doméstica.

Nem todo estado possui juizados especializados. Por isso, para a Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ), nas comarcas onde não há vara especializada em violência doméstica,

é possível ao juízo cível aplicar as medidas protetivas previstas na Lei 11.340/2006 (Lei Maria da Penha). Leia mais aqui.

Lei 13.894/2019

A referida lei 13.894/2019 incluiu o artigo 14-A e seus parágrafos na Lei Maria da Penha. Vejamos a redação:

Art. 14-A. A ofendida tem a opção de propor ação de divórcio ou de dissolução de união estável no Juizado de Violência Doméstica e Familiar contra a Mulher.        

§ 1º Exclui-se da competência dos Juizados de Violência Doméstica e Familiar contra a Mulher a pretensão relacionada à partilha de bens.   

§ 2º Iniciada a situação de violência doméstica e familiar após o ajuizamento da ação de divórcio ou de dissolução de união estável, a ação terá preferência no juízo onde estiver. 

6. Quais os tipos de violência doméstica?

Art. 7º São formas de violência doméstica e familiar contra a mulher, entre outras:

I – a violência física, entendida como qualquer conduta que ofenda sua integridade ou saúde corporal;

II – a violência psicológica, entendida como qualquer conduta que lhe cause dano emocional e diminuição da auto-estima ou que lhe prejudique e perturbe o pleno desenvolvimento ou que vise degradar ou controlar suas ações, comportamentos, crenças e decisões, mediante ameaça, constrangimento, humilhação, manipulação, isolamento, vigilância constante, perseguição contumaz, insulto, chantagem, ridicularização, exploração e limitação do direito de ir e vir ou qualquer outro meio que lhe cause prejuízo à saúde psicológica e à autodeterminação;

II – a violência psicológica, entendida como qualquer conduta que lhe cause dano emocional e diminuição da autoestima ou que lhe prejudique e perturbe o pleno desenvolvimento ou que vise degradar ou controlar suas ações, comportamentos, crenças e decisões, mediante ameaça, constrangimento, humilhação, manipulação, isolamento, vigilância constante, perseguição contumaz, insulto, chantagem, violação de sua intimidade, ridicularização, exploração e limitação do direito de ir e vir ou qualquer outro meio que lhe cause prejuízo à saúde psicológica e à autodeterminação;             (Redação dada pela Lei nº 13.772, de 2018)

III – a violência sexual, entendida como qualquer conduta que a constranja a presenciar, a manter ou a participar de relação sexual não desejada, mediante intimidação, ameaça, coação ou uso da força; que a induza a comercializar ou a utilizar, de qualquer modo, a sua sexualidade, que a impeça de usar qualquer método contraceptivo ou que a force ao matrimônio, à gravidez, ao aborto ou à prostituição, mediante coação, chantagem, suborno ou manipulação; ou que limite ou anule o exercício de seus direitos sexuais e reprodutivos;

IV – a violência patrimonial, entendida como qualquer conduta que configure retenção, subtração, destruição parcial ou total de seus objetos, instrumentos de trabalho, documentos pessoais, bens, valores e direitos ou recursos econômicos, incluindo os destinados a satisfazer suas necessidades;

V – a violência moral, entendida como qualquer conduta que configure calúnia, difamação ou injúria.

7. Direitos do Acusado de Violência Doméstica

Os direitos do acusado de violência doméstica também são fundamentais para um julgamento justo.

O art. 5º, LV da Constituição Federal garante o contraditório e a ampla defesa.

No contexto do CPP, o acusado tem direito a ser representado por um advogado (art. 261), apresentar provas e testemunhas (art. 156) e apelar em caso de condenação (art. 593).

Jurisprudências recentes reforçam a importância de garantir os direitos do acusado, mesmo em casos de violência doméstica, para evitar injustiças e violações dos direitos humanos.

8. Papel das Instituições e Sociedade

O combate à violência doméstica requer a cooperação de diversas instituições.

Delegacias especializadas no atendimento à mulher desempenham um papel crucial no registro de denúncias e na aplicação de medidas protetivas.

Além disso, organizações não-governamentais e grupos de apoio são essenciais para fornecer suporte emocional e psicológico às vítimas.

A doutrina enfatiza a necessidade de uma abordagem interdisciplinar,

com advogados criminais colaborando com essas instituições para garantir uma resposta eficaz à violência doméstica.

9. Conclusão e Recomendações

O combate à violência doméstica é um desafio complexo que requer ações coordenadas entre o sistema judicial, instituições de apoio e sociedade.

Recomendações para advogados criminais incluem a necessidade de

conhecimento profundo das leis e procedimentos, sensibilidade para lidar com vítimas e acusados, e colaboração com outras instituições para garantir um processo justo e eficaz.

10. Como aprender a advogar na prática da Lei Maria da Penha?

A defesa de uma vítima ou um acusado de violência doméstica pode apresentar diversos desafios, incluindo a dificuldade de conseguir provas, a resistência da vítima em denunciar o agressor e a pressão da opinião pública.

É importante estar preparado para esses desafios e encontrar formas de superá-los.

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