Cadeia de custódia no processo penal e o kit cellebrite
Hoje, você vai aprender mais sobre Cadeia de custódia e kit Cellebrite no processo penal, e dicas práticas envolvendo o tema que é essencial pra sua advocacia criminal.
A cadeia de custódia é um conceito fundamental no processo penal, especialmente na coleta, armazenamento e análise de provas.
E para advogados criminalistas, o conhecimento do funcionamento e das limitações do Cellebrite é fundamental para
contestar provas obtidas por meio dessa tecnologia em processos penais.
Se você atua ou deseja advogar na área criminal, precisa dominar esse assunto. Vamos conferir?
Continue a leitura abaixo e potencialize sua prática penal:
Cadeia de Custódia no Processo Penal: Fundamentos, Legislação, Exemplos e Dicas para Advogados
A cadeia de custódia é um conceito fundamental no processo penal, especialmente na coleta, armazenamento e análise de provas.
Ela se refere ao caminho que a evidência percorre desde a coleta até a apresentação em tribunal, incluindo todos os procedimentos para garantir a autenticidade e integridade da prova.
A partir de agora vamos explorar a importância da cadeia de custódia, a legislação aplicável, exemplos de aplicação prática e dicas para advogados.
O Que é Cadeia de Custódia?
A cadeia de custódia é o processo de documentação e controle do uso e do armazenamento das evidências obtidas durante uma investigação criminal.
O objetivo é assegurar que a prova não seja adulterada, comprometida ou contaminada, garantindo sua validade para uso judicial.
A cadeia de custódia busca registrar todos os envolvidos no manuseio da prova e documentar qualquer transferência ou manipulação.
Legislação sobre Cadeia de Custódia
A Lei nº 13.964/2019, conhecida como “Pacote Anticrime”, trouxe significativas alterações ao Código de Processo Penal (CPP) e introduziu normas mais rígidas para a cadeia de custódia.
O artigo 158-A do CPP define a cadeia de custódia como
“o conjunto de todos os procedimentos utilizados para manter e documentar a história cronológica do vestígio, a partir de seu reconhecimento até o descarte”.
O início da cadeia de custódia dá-se com a preservação do local de crime ou com procedimentos policiais ou periciais nos quais seja detectada a existência de vestígio (§ 1º).
O agente público que reconhecer um elemento como de potencial interesse para a produção da prova pericial fica responsável por sua preservação (§ 2º).
Vestígio é todo objeto ou material bruto, visível ou latente, constatado ou recolhido, que se relaciona à infração penal (§ 3º).
Fases da Cadeia de Custódia
De acordo com o artigo 158-B do CPP, a cadeia de custódia possui várias fases, incluindo:
- Reconhecimento: ato de distinguir um elemento como de potencial interesse para a produção da prova pericial;
- Isolamento: ato de evitar que se altere o estado das coisas, devendo isolar e preservar o ambiente imediato, mediato e relacionado aos vestígios e local de crime;
- Fixação: descrição detalhada do vestígio conforme se encontra no local de crime ou no corpo de delito, e a sua posição na área de exames, podendo ser ilustrada por fotografias, filmagens ou croqui, sendo indispensável a sua descrição no laudo pericial produzido pelo perito responsável pelo atendimento;
- Coleta: ato de recolher o vestígio que será submetido à análise pericial, respeitando suas características e natureza;
- Acondicionamento: procedimento por meio do qual cada vestígio coletado é embalado de forma individualizada, de acordo com suas características físicas, químicas e biológicas, para posterior análise, com anotação da data, hora e nome de quem realizou a coleta e o acondicionamento;
- Transporte: ato de transferir o vestígio de um local para o outro, utilizando as condições adequadas (embalagens, veículos, temperatura, entre outras), de modo a garantir a manutenção de suas características originais, bem como o controle de sua posse;
- Recebimento: ato formal de transferência da posse do vestígio, que deve ser documentado com, no mínimo, informações referentes ao número de procedimento e unidade de polícia judiciária relacionada, local de origem, nome de quem transportou o vestígio, código de rastreamento, natureza do exame, tipo do vestígio, protocolo, assinatura e identificação de quem o recebeu;
- Processamento: exame pericial em si, manipulação do vestígio de acordo com a metodologia adequada às suas características biológicas, físicas e químicas, a fim de se obter o resultado desejado, que deverá ser formalizado em laudo produzido por perito;
- Armazenamento: procedimento referente à guarda, em condições adequadas, do material a ser processado, guardado para realização de contraperícia, descartado ou transportado, com vinculação ao número do laudo correspondente;
- Descarte: procedimento referente à liberação do vestígio, respeitando a legislação vigente e, quando pertinente, mediante autorização judicial.
De forma resumida das fases da cadeia de custódia são:
- Reconhecimento: Identificação do vestígio a ser coletado.
- Isolamento: Garantia de que o vestígio esteja protegido contra contaminação ou adulteração.
- Coleta: Recolhimento do vestígio de forma correta e documentada.
- Acondicionamento: Armazenamento seguro do vestígio.
- Transporte: Transporte seguro até o local de análise.
- Recebimento: Registro da chegada do vestígio no local de análise.
- Processamento: Análise e processamento do vestígio.
- Armazenamento: Manutenção do vestígio de forma segura até sua apresentação em tribunal.
- Exame Pericial: Avaliação do vestígio por especialistas.
- Descarte: Disposição final do vestígio, se necessário.
Qual a importância da Cadeia de Custódia?
A cadeia de custódia é crucial para garantir a confiabilidade da prova.
Se houver quebra na cadeia de custódia, a evidência pode ser considerada comprometida e, portanto, inadmissível em tribunal.
A falha em manter uma cadeia de custódia adequada pode resultar na anulação da prova e até mesmo em ações judiciais contra as autoridades responsáveis.
Exemplos de Quebra de Cadeia de Custódia
A quebra da cadeia de custódia pode ocorrer de diversas maneiras, como:
- Manuseio Inadequado: Quando a prova é manuseada por pessoas não autorizadas ou sem documentação adequada.
- Falta de Isolamento: Se a prova é deixada sem proteção, permitindo contaminação ou adulteração.
- Transporte Inseguro: Se o vestígio não é transportado de maneira segura, sem documentação clara.
- Ausência de Documentação: Se não houver registros claros sobre quem manuseou a prova e quando isso ocorreu.
Kit Cellebrite: Como Funciona o Software Usado para Recuperar Provas
Essa ferramenta foi utilizada no caso Henry. Para avançar na investigação contra o vereador Dr. Jairinho (ex-Solidariedade) e a professora Monique Medeiros, a polícia do Rio de Janeiro recorreu ao Cellebrite Premium, uma sofisticada ferramenta israelense de perícia digital.
Este software foi usado para recuperar mensagens e outros dados excluídos dos celulares relacionados ao caso da morte do menino Henry Borel, de quatro anos.
A companhia israelense já ofereceu produtos para a Polícia Federal em investigações da Operação Lava Jato.
O que é o Cellebrite Premium?
O Cellebrite Premium é um software desenvolvido pela empresa israelense Cellebrite, especializada em extração de dados de dispositivos eletrônicos.
A companhia oferece soluções voltadas para investigações policiais, sendo que sua comercialização é restrita às autoridades para garantir a segurança das operações.
Embora seja uma ferramenta poderosa, ela não é infalível e sua aplicação exige cuidados específicos.
De acordo com a Cellebrite, o software pode desbloquear celulares com sistemas Android e iOS, utilizando técnicas que devem ser mantidas em segredo.
Ele é projetado para ser usado em laboratórios com especialistas certificados em inteligência digital, garantindo que as provas obtidas sejam juridicamente válidas.
Como o Cellebrite Premium opera?
Os detalhes exatos de como o Cellebrite Premium funciona não são divulgados, pois se trata de um segredo comercial.
No entanto, sabe-se que o software utiliza uma combinação de métodos para explorar falhas de segurança nos sistemas operacionais, permitindo desbloquear dispositivos e recuperar dados.
Essas técnicas exigem atualizações frequentes para acompanhar as mudanças nos sistemas operacionais.
O software pode empregar soluções de hardware e software para desbloquear ou extrair informações de um aparelho, semelhantes a ferramentas usadas para manutenção de computadores e discos rígidos.
Além disso, é essencial garantir que a extração de dados não comprometa a integridade das informações, garantindo sua validade como prova.
Razões para Manter os Métodos em Sigilo
O sigilo em torno dos métodos utilizados pelo Cellebrite Premium tem várias razões.
Por um lado, isso evita que informações sensíveis caiam em mãos erradas, o que poderia ser perigoso se criminosos ou hackers tivessem acesso a essas tecnologias.
Por outro lado, se as técnicas fossem divulgadas, os fabricantes de celulares corrigiriam as falhas de segurança, tornando o produto obsoleto.
Além disso, a manutenção do sigilo ajuda a proteger a validade dos acordos comerciais da empresa e sua capacidade de oferecer um produto diferenciado.
Dessa forma, as empresas que desenvolvem ferramentas de perícia digital precisam equilibrar a eficácia com a segurança.
Provas Recuperadas no Caso Henry Borel
No caso da morte de Henry Borel, a perícia digital realizada com o Cellebrite permitiu que a polícia recuperasse diversas conversas e capturas de tela de celulares que contribuíram para a investigação.
As provas obtidas forneceram indícios importantes sobre o caso, inclusive revelando mensagens que levantavam suspeitas sobre a conduta de Jairinho em relação ao menino Henry.
O trabalho de perícia digital é essencial em investigações criminais, especialmente em casos complexos como esse, onde as provas obtidas podem ser cruciais para a resolução do caso.
Dicas para Advogados sobre cadeia de custódia
Advogados que atuam em casos criminais devem estar atentos à cadeia de custódia para proteger os direitos de seus clientes e garantir um processo justo.
Aqui estão algumas dicas para advogados:
1. Verifique a Documentação
Examine todos os registros relacionados à prova para garantir que a cadeia de custódia foi mantida.
Procure por lacunas ou inconsistências nos documentos.
2. Questione a Integridade da Prova
Se houver indícios de quebra na cadeia de custódia, questione a integridade da prova.
Aponte inconsistências ou falhas no processo para contestar a admissibilidade da evidência.
3. Solicite Perícia Independente
Se necessário, solicite uma perícia independente para avaliar se a prova foi comprometida.
Uma perícia independente pode identificar sinais de manipulação ou adulteração.
4. Proteja os Direitos do Cliente
Se a cadeia de custódia foi comprometida, argumente que a prova deve ser excluída do processo.
Use as falhas na cadeia de custódia para proteger os direitos do cliente e buscar um julgamento justo.
5. Conheça a Legislação
Mantenha-se atualizado com as mudanças na legislação sobre cadeia de custódia.
Conhecimento das leis e regulamentos aplicáveis permitirá que você identifique falhas e defenda seu cliente de forma eficaz.
Além disso, para advogados criminalistas, o conhecimento do funcionamento e das limitações do kit Cellebrite é fundamental para contestar provas obtidas por meio dessa tecnologia em processos penais.
Como pontuado acima, uma estratégia eficaz para advogados criminalistas é solicitar perícia independente para avaliar a autenticidade e a integridade das provas obtidas com o Cellebrite.
Peritos podem analisar os dados extraídos para identificar falhas ou inconsistências que possam prejudicar a validade das evidências.
Além disso, uma perícia independente pode revelar se a extração foi conduzida de maneira ética e em conformidade com as leis e regulamentos aplicáveis.
Conclusão
A cadeia de custódia é um elemento fundamental no processo penal, garantindo que as provas sejam tratadas com autenticidade e integridade.
Quebras na cadeia de custódia podem comprometer a admissibilidade das provas e afetar a justiça do processo penal.
Advogados devem estar atentos a esses aspectos para proteger os direitos de seus clientes e garantir um processo penal justo e equilibrado.
Com uma abordagem criteriosa, advogados podem usar a cadeia de custódia para contestar provas e fortalecer a defesa de seus clientes.
Leia a última decisão do STJ sobre o tema AQUI.
Leia mais: A cadeia de custódia no processo penal segundo o STJ – IDPB
Como se especializar na Advocacia Criminal?
Não deixe de conhecer nosso curso de prática clicando na imagem abaixo:
Respostas de 4
Dra Dupret
Aula maravilhosa, teoricamente falando, mas, na prática, não se vê a cadeia de custódia, que seria o “pulo do gato”, vez que não saberia avaliar as provas para defender o cliente, razão pela qual pergunta-se:
1. É necessário, que o advogado faça um curso tecnológico e perícia?
2. Há possibilidade dos prints do WatsApp servir como provas, considerando, o próprio WatsApp garante segurança com criptografia ponto a ponto?
Olá, Helio,
obrigada pelo retorno da aula.
1 – Não há necessidade de se aprofundar tanto, mas há casos mais complexos em que vale a pena contratar um perito particular.
2 – O STJ entendeu recentemente que apenas se houver a tecnologia celebrite, que faz extração segura de dados. Como provas da defesa, vale a utilização, mas recomendo lavrar ata notarial.
Um abraço!
Cris Dupret
Excelente material didático
Excelente!!!muito gratificante saber sobre mais uma ferramenta para nós advogado(a) criminalista. Com certeza o conhecimento sempre nos agrega . Gostei muito. Excelente explicação.