Nova Lei 15.229/2025 e o Estelionato contra Pessoa com Deficiência
Foi sancionada pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva a Lei nº 15.229/2025, que altera o Código Penal (Decreto-Lei nº 2.848/1940) para tornar incondicionada a ação penal por crime de estelionato cometido contra pessoa com deficiência.
A medida, publicada no Diário Oficial da União em 3 de outubro de 2025, representa uma mudança significativa na persecução penal desses casos — e merece atenção especial de advogados criminalistas, tanto na defesa quanto na atuação como assistentes de acusação.
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O que muda na lei
Até então, desde a Lei Anticrime (Lei 13.964/2019), o art. 171, §5º, do Código Penal previa que a ação penal por estelionato seria pública condicionada à representação, salvo quando a vítima fosse:
a Administração Pública;
criança ou adolescente (menor de 18 anos);
pessoa com mais de 70 anos;
pessoa com deficiência mental ou incapaz.
Com a nova redação dada pela Lei 15.229/2025, todas as pessoas com qualquer tipo de deficiência — física, sensorial, mental ou intelectual — passam a estar protegidas pela ação penal pública incondicionada.
Isso significa que o Ministério Público poderá oferecer denúncia independentemente da vontade da vítima, bastando a notícia do crime.
O fundamento da alteração: proteção ampliada às pessoas vulneráveis
O projeto que deu origem à nova lei (PL 3.114/2023 teve como justificativa a necessidade de estender a proteção penal a pessoas com deficiência física ou sensorial, que também podem se encontrar em situação de vulnerabilidade diante de fraudadores.
A senadora autora do projeto Damares Alves argumentou que a exigência de representação poderia gerar obstáculos intransponíveis para muitas vítimas, especialmente aquelas com limitações de locomoção ou comunicação. Durante a tramitação, ressaltou-se a importância da medida como um ato de humanidade e proteção.
A proposta foi relatada na Comissão de Constituição e Justiça do Senado (CCJ) pelo senador Plínio Valério (PSDB-AM) e aprovada com parecer favorável ainda em 2024.
Aplicação da lei penal no tempo: a irretroatividade da lei mais gravosa
A Lei nº 15.229/2025 entrou em vigor no dia de sua publicação, em 3 de outubro de 2025, conforme determina o art. 2º da própria norma.
Essa informação é relevante para a prática penal, pois a modificação legislativa não pode ser aplicada a fatos anteriores à sua vigência, em respeito ao princípio da irretroatividade da lei penal mais severa, previsto no art. 5º, XL, da Constituição Federal e no art. 2º, parágrafo único, do Código Penal (a contrario sensu).
A alteração legal, ao transformar o crime de estelionato contra pessoa com deficiência em ação penal pública incondicionada, retira uma condição de procedibilidade — a representação da vítima — que anteriormente limitava a atuação estatal.
Essa mudança amplia o poder persecutório do Estado e, portanto, é considerada prejudicial ao réu, não podendo ser aplicada retroativamente.
Em termos práticos, isso significa que:
Para os fatos ocorridos antes de 3 de outubro de 2025, a ação penal continuará condicionada à representação da vítima, conforme a redação anterior do art. 171, §5º, do Código Penal.
Apenas os crimes praticados a partir dessa data serão processados por meio de ação pública incondicionada.
Essa distinção temporal é essencial para a estratégia defensiva:
o advogado deve sempre verificar a data do fato delituoso e avaliar se a ação penal foi corretamente proposta sob a vigência da lei aplicável.
Caso o Ministério Público ofereça denúncia sem representação em relação a crime ocorrido antes da nova lei, a defesa poderá suscitar nulidade ou ausência de condição de procedibilidade, com base no princípio da legalidade e da irretroatividade da lei penal maléfica.
Consequências práticas na atuação penal
1. Ministério Público e o início da persecução penal
Com a mudança, não será mais necessária a representação da vítima para que o Ministério Público ofereça a denúncia.
Isso implica que, tendo ciência do crime por qualquer meio, o órgão ministerial deve instaurar o procedimento investigatório e adotar as medidas cabíveis — o que reforça o caráter oficial e compulsório da persecução penal nesses casos.
2. Defesa técnica: atenção ao momento da persecução
Para os advogados criminalistas que atuam na defesa, é fundamental compreender que a ausência de representação não mais constitui causa de nulidade ou de extinção da punibilidade.
Assim, estratégias defensivas que antes exploravam a ausência de manifestação da vítima perdem eficácia diante do novo regime jurídico.
Contudo, a defesa poderá questionar, quando pertinente, a caracterização da deficiência ou a vulnerabilidade concreta da vítima, já que a incondicionalidade depende da presença inequívoca dessa condição.
3. Atuação como assistente de acusação
Por outro lado, para os advogados que representam vítimas ou familiares, a alteração facilita o acesso à Justiça.
Mesmo que a vítima não tenha condições de registrar ocorrência, o Ministério Público poderá agir de ofício, e o advogado pode acompanhar o procedimento desde o inquérito, atuando como assistente de acusação para garantir que os interesses da vítima sejam efetivamente resguardados.
Contexto e política criminal
A alteração se insere em um movimento legislativo de reforço à proteção de grupos vulneráveis, alinhado com a Convenção Internacional sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência (Decreto 6.949/2009), que reconhece a obrigação do Estado brasileiro de assegurar acesso igualitário à Justiça.
Sob a ótica da política criminal, a mudança reflete uma tendência de expansão do Direito Penal protetivo, ainda que isso também levante debates sobre a autonomia da vontade da vítima e a seletividade das tutelas penais.
Conclusão: impacto direto na rotina do advogado criminalista
A Lei 15.229/2025 traz impacto imediato na rotina de quem atua na advocacia criminal.
O profissional deve estar atento às novas hipóteses de ação pública incondicionada, pois a alteração muda o momento de início da persecução penal, o papel da vítima e as estratégias de defesa.
Mais do que uma simples atualização legislativa, trata-se de um avanço na proteção jurídica de pessoas com deficiência, que passa a ter o Estado como protagonista na resposta penal a fraudes e golpes que exploram sua vulnerabilidade.
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